quarta-feira, 17 de abril de 2013

No almoço, conversamos bastante, D. Marina e eu. Seu Augusto era um homem calado... pelo menos foi o que pareceu. Mas tinha um olhar tão bondoso, gestos tão calmos, que deixavam qualquer um à vontade. Almoçou devagarinho, mastigava a comida com uma tranquilidade que nunca vi igual. Tive a impressão de estar diante de alguém que jamais havia reclamado de nada. Alguém que sabia viver. Pensei: "aí uma pessoa que faz feliz quem está por perto".

Cadu estava felicíssimo... ele adora feijão, come feijão purinho, purinho... e o da vovó Marina - como ela disse a ele que a chamasse - estava realmente delicioso. Tomou suco e mais suco... e, de sobremesa, salada de frutas.

Depois foi pra frente da TV, assistiu a uns dois ou três desenhos e adormeceu. Seu João gentilmente se ofereceu para colocá-lo no quarto que havia sido de seu filho - agora era pros netinhos.

Ajudei D. Marina a recolher a mesa... a louça sempre ficava por conta do seu João.

Enquanto Cadu dormia aproveitei pra ir rapidinho a uma loja de produtos agropecuários (que depois descobri ser a única dos cinco ou seis bairros próximos à Trindade).

Minha experiência profissional em Terra Roxa: vendedora de produtos agropecuários. Claro que não era só isso que eu fazia lá.

Com a minha formação técnica, atendia a quatro, cinco... às vezes alguns mais... agricultores em suas casas.

Amo trabalhar na terra, entendo quase tudo de terra, plantação de hortaliças, flores e outras coisas mais que você joga uma sementinha e daqui a pouquinho vira algo pra comer.

Lá fui eu ver se conseguia um trabalho.

segunda-feira, 15 de abril de 2013

A vida dá um jeito...a vida sempre dá um jeito de nos surpreender... intercala surpresas boas e ruins. Acho que só assim dá gosto de viver. Se só houvesse surpresas boas, acho que iríamos enjoar... nem notar as coisas boas. Se só houvesse coisas ruins, não iríamos suportar, iríamos enlouquecer. Então, a vida mescla coisas boas e ruins... valorizamos aquelas, quando estas acontecem... suportamos estas, lembrando-nos daquelas.

Não sou o tipo de pessoa que fica buscando explicação pras coisas... sei que as coisas acontecem... o dia que deixarem de acontecer, estarei morta. Então, enquanto acontecem, estou viva... vivinha da silva. Também não sei se existe destino... prefiro não pensar muito nisso. Imagina se estou destinada a algo muito ruim... se estou destinada, não posso fazer nada pra mudar.

Acredito em Deus... mas é uma crença tão frágil. Na verdade, não sei bem se é tão frágil assim, porque morro de medo dEle. Se morro de medo de algo/de alguém, é porque acredito que esse algo/alguém existe... se não, não morreria de medo.

Errei tanto, pequei, segundo os padrões da minha religião, tanto... que só o que posso esperar é castigo... nesta vida e na outra (seja lá de que jeito for essa outra). Às vezes, me vejo no Purgatório... purgando, purgando, sendo acrisolada, limpada, purificada de todos os pecados... vejo a minha alma branquinha depois da limpeza... mas é engraçado que não me vejo no céu... depois da limpeza.

Mas, independentemente de pra onde eu vou... quero ensinar o meu filho a andar no caminho do bem... pro meu filhote não consigo ver nada que não o céu. E quero o céu pra ele agora também, não só depois... bem depois.

E estou desconfiada que um pedacinho do céu aqui na terra, no momento presente, é o apartamento da minha vizinha... e que ela é uma anja que Deus deixou vir pra cá pra me ajudar a fazer com que a vida de Cadu tenha um pouquinho do céu por aqui. Acho que Deus, acho, não, tenho certeza de que Deus sabia que eu não ia dar conta sozinha...

O almoço foi realmente maravilhoso.

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Quando estava girando a chave na fechadura da porta do apartamento, apareceu minha vizinha. Ela tinha um linda cesta na mão cheia de coisas. ´Um presente de boas-vindas´, disse ela... e me entregou a cesta.

Frutas, sucos, biscoitos, pãezinhos... e pro Cadu uma caixa de bombons.

Fiquei atônita... parada com a cesta na mão, sem saber o que dizer, como reagir. Não estou acostumada a esse tipo de coisas. De onde vim, presentes são dados a pessoas que conhecemos, de quem gostamos e em datas especiais. E aí, do nada, a minha vizinha que nem me conhecia bem estava me dando um senhor presente.

Ela percebeu meu embaraço e falou ´sempre faço isso... este é um apartamento pra alugar, e sempre estão chegando pessoas diferentes... gosto que se sintam bem aqui´.

´Claro, claro´, falei... ´é que fiquei surpresa... isso nunca aconteceu comigo... muito obrigada´, e dei um abraço meio sem jeito nela. Um abraço exatamente contrário do dela...

´Deixa que eu ajudo você a guardar as coisas´, falou, entrando comigo no apartamento. E eu continuava sem jeito, sem saber onde colocar nem as mãos... envergonhada. Agora, mais ainda, ela ia ver que eu estava em um apartamento quase vazio, frio, sem nadinha daquelas coisas que transformam uma casa em lar.

Ela pareceu não se importar com isso... mas uma coisa ela notou: não havia fogão na cozinha.... e como eu estava encabulada.

´Hoje vocês são meus convidados para almoçar... é bem simplizinho, mas todo mundo fala que o meu feijão é o melhor da cidade´, disse sorrindo, deixando aparecer duas covinhas em seu rosto redondinho.

Eu disse que sempre dou um jeito... agora, pensando melhor, a vida dá um jeito pra mim.


terça-feira, 9 de abril de 2013

Perdida em meus pensamentos fiquei por um tempo... só me dei conta de que o Sol tinha continuado sua caminhada pelo céu quando senti o seu forte calor em meu rosto. Já eram quase 11 horas. Quase hora do almoço.

Ah! o almoço... o que fazer, como fazer? Pensei em começar a reclamar da vida... por que eu? por que isso? pra que me colocar nesta situação?

Claro que imediatamente parei. Afinal eu tinha culpa no cartório... meu passado me condenava; então se a vida me impingia sofrimento era para me depurar, purificar... eu precisava disso. Tudo bem, mas e meu filho? O pequeninho não tem culpa de nada... o erro é meu... que seja eu a castigada.

Ainda pensando assim e num começo de revolta me levantei e segui na direção do meu pequeno.

Uma gostosa gargalhada me fez parar. Olhei na direção da gangorra e vi uma menininha com sua mãe. A mãe segurava na mãozinha dela e passava por todo o brinquedo, explicando o que era, de que material era feito, qual a cor. A mãe brincava: "adivinha de que cor que é?"... a menininha invariavelmente respondia "é azul" (nada na gangorra era azul).... e as duas caiam na gargalhada. A mãe pacientemente falava a cor correta.

A menininha não errava... ela simplesmente não enxergava.

Aquilo me tocou profundamente. Olhei pro meu filho e imaginei tudo o que essa garotinha não podia ver. O meu filho podia. O nosso maior problema era o almoço.

Sempre dizem que antes de reclamar a gente deve olhar pra quem está  pior. E sempre tem gente pior.

Peguei-o no colo, dei um milhão de beijos... e "vamos almoçar", falei.

Eu sabia que ia dar um jeito... eu sempre dou um jeito.

segunda-feira, 8 de abril de 2013

Não posso dizer que foi um sono tranquilo. A noite era quente, quase sufocante... nenhum ventinho. E os mosquitos fizeram a festa... percebi isso ao olhar pro rostinho de Cadu quando amanheceu.

A gente não pensa muito quando resolve se mudar de uma cidade pra outra. Não se dá conta de que tem de começar quase do zero... aos poucos fui percebendo como precisaria de dinheiro.

E, por falar em dinheiro, como ele facilita a vida. E como a vida pode ser dura sem ele. Se não me engano foi Wood Allen que disse, ou escreveu, não sei bem, que o dinheiro não traz felicidade, mas provoca uma sensação tão parecida que é necessário um especialista para verificar a diferença. Concordo com ele, neste momento de minha vida eu queria ter dinheiro, mais do pouquinho que tenho, pra, pelo menos, dar ao meu filho o básico: a sopa quentinha, o leite quentinho, o shampoo cheirosinho dele, o suquinho de laranja (o preferido dele), o suquinho do Bob Sponja (o segundo preferido dele), a banana amassadinha com mel e aveia.... e qualquer outra coisa que evitasse de ele ter seu rostinho picado pelos mosquitos.

Ah! mas eu vou conseguir... custe o que custar. Ele vai ter o básico e um pouquinho mais... ah vai... se vai! Os mosquitos estão com os dias contados....

O meu anjinho acordou um pouquinho antes das 9 horas. Todo sorridente, me abraçou e perguntou `vamos ao parquinho?`... `vamos sim, meu amor, claro que vamos`, respondi.

Tomamos nosso leite com cereal, escovamos os dentes e descemos ao parquinho.


Enquanto ele brincava com dois amiguinhos que fez logo que entrou no parquinho, eu pensava, pensava... fazia cálculos mentais... tentava organizar as ideias na cabeça pra depois colocá-las em prática na nossa vida real.

Eu preciso de um emprego... e é já. Eu preciso encontrar uma creche pro Cadu... e é já. Eu preciso... eu preciso... eu preciso... e aí fiquei, perdida em meus pensamentos.

segunda-feira, 1 de abril de 2013

Subimos pro apartamento. Na entrada do prédio, conheci Dona Marina (ela se transformou em minha ajudadora, espero que Deus dê a ela duas vezes mais do que ela deu pra mim... só com isso ela teria o suficiente pra viver dez vidas). Mais que uma mãe, mais que uma irmã, mais que uma amiga.

Ela sorriu, perguntou meu nome e o de Cadu. Falei algumas coisinhas sobre nossa chegada à cidade grande e ela falou: 'o que você precisar, conte comigo... moro no 22'.

Agradeci e pensei em anjos... acho que Deus espalha alguns por aí.

Banheiro... banho. Só aí lembrei que não tinha sabonete. Desci novamente e saí procurar um mercadinho. Há duas quadras do condomínio encontrei um. Comprei o sabonete, dois pãezinhos pro café da manhã (sem café, é claro), uma caixa de cereais coloridos, que o Cadu adorou e uma caixa de leite.

Banho tomado, comemos um prato de cereais com leite. Não foi bem um prato. Coloquei nos copos que estavam sobre o tampo da pia e engolimos. Não havia pratos, não havia talheres. Mas, tudo bem, eu sou craque em dar um jeito. E dei!

A noite estava quente, sufocante mesmo.. nem um ventinho. Deixei as janelas abertas pra ventilar e os mosquitos fizeram a festa...

Mais ou menos 9 horas, fomos dormir. Fiz um travesseiro com duas camisetas minhas, abracei meu filho e sonhei...

Um sonho cor de rosa... amanhã vamos sair e comprar cortinhas de florzinhas coloridas... uma manta colorida pra cama... travesseiros branquinhos, lençóis cheirozinhos, umas plantinhas pra alegrar o apartamento... e adormeci.