sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Meu filhinho ficou doente. Uma virose.... acho.

O corpinho dele queima em febre... deduzo que seja febre pelo seu rostinho quase pegando fogo, suas mãozinhas muito quentes, entre as minhas... deduzo, não tenho um termômetro e não tenho dinheiro pra comprar. E não tenho remédio nenhum pra dar, e não tenho dinheiro pra pagar uma consulta médica, e não tenho um plano de saúde, e não tenho condições de criar meu filho aqui sozinha e sem dinheiro.

Choro, abraço o corpinho dele na tentativa vã de transferir sua febre pra mim... na tentativa de tirar a dor que o aflige, que o maltrata e transferi-la pra mim. O meu corpo suporta... é forte. Mas, tentativas vãs. Ele treme, diz que sente frio... e eu não tenho cobertas suficientes pra aquecê-lo. Abraço-o forte.

Choro e rezo. 'Deus tira a dor, a doença do meu filho, leva essa febre embora'.... peço com a fé de uma criança.

A febre parece aumentar.... o calor só faz aumentar. Eu fico mais assustada porque sei o que significa o aumento da temperatura do corpo.... sei que está sinalizando uma atividade mais intensa do sistema imunológico para combater a ação de vírus ou de bactérias que estão atacando o organismo... o corpinho do meu bebê.


Coloco uma toalha molhada no rostinho dele pra refrescar... faço compressas bem de levinho... poderia fazer um chá. Mas não tenho chá... aqueço um pouco de água e coloco duas colherinhas de açúcar... faço de conta que é chá. Tenho de me convencer de que ele assim vai melhorar.

Ele dorme... o sono é agitado no início, ele suou muito.... troco bem devagarinho o pijaminha dele.

A noite passa, o dia chega e o sol me encontra ainda abraçada com meu filho.... creio que cochilei um pouquinho. Tenho de me convencer de que dormi, de que fiquei tranquila depois de ter rezado e de que tenho fé de que Deus, independentemente de mim, está cuidando do meu filhote. Preciso acreditar nisso... Todo mundo diz que pensamento positivo é indispensável pra coisas darem certo.

E eu sou uma pessoa que pensa positivo... independentemente de tudo... tudo vai dar certo, no fim tudo vai dar certo.

sexta-feira, 12 de julho de 2013

Minha prima, Je, é de uma beleza incrivelmente fantástica. E essa beleza confere a ela poderes que os não tão belos - como eu, por exemplo - não têm.

São perdoados os erros que ela comete, sempre. Lembro-me que desde criança ela tinha um tratamento privilegiado. Era ela e nós - os outros. Se Je queria brincar no parquinho da cidade, e o resto queria ficar brincando no quintal de casa... adivinha!? Íamos todos pro parquinho.

E, acredito que ter suas vontades sempre satisfeitas, tornaram-na no que é hoje: no mínimo, eu diria, difícil de se lidar.

Fiquei magoada com a carta? Não, claro que não... há muito tempo deixei de me magoar por não ser bem tratada por alguém. Acho que ninguém tem obrigação de gostar de mim... de me tratar bem. Aceito o sentimento genuíno das pessoas, e isso pra mim basta. E há os que gostam e os que não gostam de mim. Paciência....

Mas não posso dizer que não fiquei triste. Fiquei sim, tristíssima. Ser a causadora da tristeza de meu pai, mais uma vez... Pensar nele chorando me cortou o coração. A cena me perseguia por onde quer que eu fosse: o pomar lá da casa dele... as árvores balançando ao vento... os raios de sol passando por entre as folhas... o perfume das flores... o barulho do riacho que corre bem no fim do quintal. Tudo maravilhosamente lindo, acompanhando bem de perto a dor de meu pai.

De cortar o coração... mesmo. Mas a vida não é de toda justa. Ela comete erros. Ela atinge pessoas inocentes. Ela é a vida e ela faz o que quer.

Demorei uns diasinhos pra escrever uma carta aos meus pais... e responder a carta de minha prima.

Não queria nenhum tom de tristeza na minha escrita (e precisava ter o dinheiro pra comprar papel, envelope e selos - porque, enfim, tudo custa dinheiro).

sexta-feira, 5 de julho de 2013

A carta....

Prezada prima,

Como vai você? E o Carlos Eduardo? Conseguiu escolinha pra ele?

Aqui estamos todos indo bem, menos o tio. Desde que ele voltou de Floripa não é mais o mesmo tio alegre como eu sempre conheci. Gostaria que você me dissesse o que mais você fez de errado pra deixá-lo tão mal.

Pensei muito antes de escrever, conversei com a mãe, com o pai, com meus irmãos antes de tomar essa decisão. Todos me apoiaram. Todos disseram que eu deveria escrever pra você pra saber o que aconteceu.

Quando ele voltou, ficou três dias em casa, não saiu pra lugar nenhum; no domingo não foi nem pra missa. Todo mundo estranhou... você sabe, ele nunca falta.

No sábado tínhamos feito um churrasco pra comemorar o aniversário do pai... veio toda a família, mas ele não apareceu. A tia deu uma desculpa de que ele estava cansado da viagem.

No começo até acreditamos que ele estivesse cansado  mesmo... uma viagem de ônibus tão longa é muito cansativa mesmo. Mas o problema é que no meio da semana fomos lá na casa dos tios e vimos o quanto ele estava abatido.

A tia contou algumas coisa que ele disse... que ficou arrasado com a tua situação e do Cadu no apartamento, contou que vocês não têm muita comida, não tinham nem fogão e que ele comprou um pra vocês.

Mas disse que o que mais doeu foi ver que você no café da manhã só tinha dois pãezinhos e que deu um pra ele e pro Cadu... e que você ficou sem comer nada.

Eu sei que você fez tanta coisa errada, por isso tem de pagar por tudo. Deus realmente vai pesar a mão dele até você ficar completamente arrependida do que fez. Então, nós aqui de casa achamos que Deus está correto em deixar você passar por privações, por sofrimentos.

Mas o que não concordamos é que o tio tenha de ficar mal por você estar assim. Ele não tem culpa dos teus erros; ele sempre foi um homem muito bom, ajuda todo mundo. Ele não  tem que sofrer por você.

Quem errou foi você e quem tem de arcar com as consequências do erro é só você.

Não sabemos exatamente o que você tem de fazer. Mas, quando o tio for te visitar de novo - se ele for (porque nós achamos que a tia não vai mais deixar ele ir para aí) - pelo menos compre um pouco de comida e não reclame de nada. Diga que está tudo bem.

Procure um emprego que te dê condições de cuidar melhor do teu filho... ele não tem culpa de ter nascido em um lar que se desfez.

Também seria bom você escrever uma carta dizendo que vocês dois estão muito bem; nunca diga que está faltando alguma coisa. Mostre que vocês estão bem.... o tio tem de se convencer de que você está cuidando muito bem do neto dele, que não está deixando faltar nada pro Cadu.

Um abraço de todos nós da família,

Je

PS: a tia contou pra mãe que viu o tio chorando escondido. estou te contando isso pra você saber que é mesmo bem a greve a situação dele.

domingo, 16 de junho de 2013

Fiquei encolhida durante todo o tempo necessário. Não, não todo o tempo... acho que nem todo o tempo do mundo levaria pra longe a dor no meu coração. Fiquei encolhida o tempo que tinha para ficar encolhida.

Meu filho precisava de mim... tinha de comer, então eu não tinha tempo pra sofrer.

Levantei... automaticamente preparei algo para Cadu... e depois fomos para o apartamento das garotinhas que eu cuidava. A mãe delas me esperava como sempre: ao meio-dia.

Quando cheguei ela me disse que precisava conversar comigo quando voltasse... e eu esperei. Sabe aqueles sentimentos que vêm como uma negra nuvem a tomam conta de você? Pois é... foi assim que passei a tarde. Claro, tentei manter o controle... o pensamento positivo, mas estava difícil. Li nos olhos dela que ia me dizer algo que não seria bom.

E, realmente... às 19 horas ela chegou e disse: daqui a um mês estamos indo para a Inglaterra... meu marido vai terminar o doutorado lá e, acredito, não voltamos mais para o Brasil.

Pronto! Sem meu pai, sem meu trabalho... tudo no mesmo dia.

Não que eu não tenha ficado feliz por ela... claro... era uma mudança e tanto... morar no primeiro mundo... ficar perto de onde tudo é história... fiquei feliz por ela, sim. Mas fiquei preocupada... pois parecia que meus sonhos estavam se afastando um pouquinho mais de mim.

Até quando tenho de pagar pelos meus erros. Já pedi perdão a Deus um milhão de vezes. Definitivamente acho que Deus não está preocupado em perdoar... se você errou e errou feio... vai passar sua vida pagando pelo erro. Não importa quantas vezes pedir perdão... seu pedido não vai nem ultrapassar o teto de sua casa.

Deus, você pode esquecer quem eu fui? Você consegue ver apenas quem sou agora? Importa apenas quem eu sou... quem eu fui já passou, não importa mais, aquela não existe mais.

Bom,  acabei me forçando a um autoconvencimento: não há sofrimento que não possa ser superado.

Dez dias depois da partida de papai, recebi uma carta de minha prima, Jéssica.

segunda-feira, 10 de junho de 2013

Quando fechei a porta depois de acompanhar com os olhos meu pai descendo as escadas, senti um tremendo nó na garganta. Queria chorar e chorar, mas sabia que não podia - não queria que Cadu percebesse o quão triste eu estava, o quão solitária me sentia.

É bem verdade que cheguei só com meu filho em Florianópolis, mas não tinha dimensionado o tamanho da solidão que me acompanhava. Estava ocupada demais em organizar a vida de forma que conseguíssemos - ele e eu - nos adaptar à nova situação.

Depois da visita de meu pai - organizando o que estava desorganizado no apartamento, comprando o que faltava, suprindo nossa geladeira - percebi que estava, sem meu pai aqui, sem estrado para meus pés. Eu estava definitivamente só.

Mesmo o apoio emocional - meu pai não disse uma palavra de carinho, não perguntou se eu estava feliz com a escolha que havia feito -, não, ele não fez nada disso... mas eu me senti abraçada, cuidada. Enquanto meu pai estava aqui, eu senti que alguém se importava comigo.

Você já se sentiu só? Já sentiu, mesmo em meio a uma multidão, uma tremenda solidão? Acompanhad@... mas só? Sentiu aquela sensação ruim de não poder contar com ninguém, de estar sozinh@ no mundo? Sentiu culpa por estar só? Já se perguntou: por que não há ninguém que queira ficar perto de você? Sentiu-se culpad@ da própria solidão?

Eu só pensava: por que o castigo é tão grande? Por que a pena que me é afligida ocupa tanto espaço da minha vida? Por que tamanha intensidade de dor?

Deitei no beliche, abracei meu filho e deixei o tempo passar... só sabia que estava só, que meu filho dependia de mim para não se sentir só e que eu não podia sequer chorar.


domingo, 9 de junho de 2013

Meu relacionamento com meu pai: frio, distante. Não que ele não me amasse, mas ele nunca disse isso claramente. Havia uma ligação forte entre nós, eu sentia isso. Mas nunca, nunca sentimento nenhum foi expressado.

Nunca, não... apenas uma vez - fiz algo de que me envergonho de contar, portanto não vou escrever aqui -, ele chorou quando me ouviu dizer, entre lágrimas: 'não quero voltar pra casa'.

Foi a única vez na minha vida que o vi chorar. Isso é coisa de criação mesmo... em algumas famílias, expressar seus sentimentos é algo fácil, natural. Na minha nunca teve disso.

Só os erros dos filhos eram apontados, gritados, batidos... só. O resto parecia que não existia.

Abraço e beijo meu filho um milhão de vezes por dia... quero que ele leve pra sempre no coração, na mente, nos bolsos a certeza do meu grande amor por ele. Cadu sabe e vai saber pra sempre que, onde quer que ele esteja, aconteça o que acontecer... ele pode voltar pro meu abraço.

Filho é pra gente abraçar... soltar pro mundo... que eu sei que os filhos não são propriedade nossa... mas, filho tem de saber que pode voltar, pode contar com o aconchego do seu primeiro lar... ele tem de saber: never alone...

Era terça-feira... 8 horas, a campainha tocou. Pensei que fosse meu anjo da guarda que mora ao lado. Atendi sem nem mesmo olhar no olho mágico.

Abri a porta e parado com uma malinha na mão: meu pai.

Eu só o abracei... lembro-me bem disso... as outras lembrança que tenho dos cinco dias que ele ficou em nosso apartamento são: o momento em que o apresentei pro meu anjo da guarda, nossa ida ao supermercado e voltando cheios de sacolas de compras, o momento em que ele preencheu cinco cheques pré-datados de R$ 200, 00 (+ ou - o equivalente hoje) e disse que era para eu usar um por um nos seguintes cinco meses pra comprar comida pra mim e Cadu.... e ele descendo as escadas no momento de sua volta pra Terra Roxa.... suas costas curvadas, carregando a malinha desbotada, surrada, toda desengonçada de tanto ser jogada de lá pra cá durante toda a vida dele (era a malinha que havia ganhado de vovô quando fez 16 anos e foi para o seminário - meu pai ia, veja bem, eu disse ia, ser padre).

O que ficou depois que papai partiu: uma solidão mais imensa que já senti; um beliche com dois colchões fofinho, novinhos, limpinhos; um fogão novinho em folha; uma geladeira cheinha, cheinha de comida, sucos, bobs esponjas; um armário repleto de biscoitos, latas de leite em pó, leite condensado, caixas de sucrilhos; todas as tomadas funcionando bem certinho, lâmpadas em todos os cômodos do apartamento e uma bicicleta e uma bola pro meu pequeninho.

O que faltou quando papai partiu: meu chão....

Uma semana depois que ele partiu recebi uma carta de minha prima Carla.

Se a maldade pode ser materializada em forma de gente, ela se materializaria em forma de minha prima.

quarta-feira, 29 de maio de 2013

Cristine e Ana Luiza foram as duas primeiras crianças de que tomei conta. Duas meninas loirinhas, loirinhas, com cabelos muito lisos, compridos - em que eu fazia lindas trancinhas enfeitadas com pregadores de borboleta de todas as cores, rabo de cavalo, Maria Chiquinha. Cristine tinha 4 anos e Aninha 1 e meio.

O condomínio em que eu morava tinha quatro blocos. Eu morava no A, e elas no C. Marisa, a mãe das meninas, trabalhava em um banco das 12 às 18 horas; de manhã, ela existia só para as filhas... e a tarde era comigo que elas passavam Trabalhei com elas durante cinco meses; não ganhava muito - não lembro exatamente quanto, mas seria, acho, o equivalente de meio salário mínimo.

Mas havia vários convenientes de eu ser babá - que o dinheiro não paga: meu filho podia ficar comigo - o mais importante de tudo; meu filho tinha duas amiguinhas pra brincar; não precisava sair do condomínio - confesso que me perdia facilmente na cidade; não gastava nem com lanche, nem com jantar (aqui sim há dinheiro envolvido) - autorizada por Marisa, podia dar ao meu filho exatamente o que eu dava para as pequerruchas.

De segunda à sexta, ele comia muito bem. Nos sábados ou domingos, muitas vezes, fomos convidados a passar o dia na casa da praia do meu anjo da guarda na Barra da Lagoa... nem preciso dizer o quanto meu bebê se divertia.

E os primeiros meses para nós dois  foram assim: eu cuidando das meninas, junto com meu filho, alguns passeios na Barra... e nos acostumando com um ritmo bem diferente da nossa cidadezinha.... tudo muito calmo, muito normal.

Nesse meio tempo, meu pai veio nos visitar.

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Nasci e cresci numa cidadezinha do interior. Numa casinha simples de madeira pintada de verde, com janelas brancas. Tinha meu próprio quartinho e assim que consegui entender de cores, nele tudo era branco, com alguns detalhezinhos de rosa... tudo muito clarinho, muito limpinho, organizadinho.

As visitas, minhas amiguinhas, os parentes, todos sempre diziam: `Como é agradável o teu quartinho... aqui tudo é tão leve, tão fresquinho; é tão bom ficar aqui`.

Não sei se foi de tanto ouvir isso ou se porque era gostoso mesmo ficar lá que eu ficava a maior parte do meu tempo no meu quarto...

Eu adorava ficar horas e horas brincando de casinha com uma amiga. Lara, que morava na casa ao lado da nossa. Brincávamos e brincávamos. Depois aprendemos a ler... e de brincar de casinha passamos para os livros. O primeiro livro que li foi O menino do dedo verde, e simplesmente me apaixonei... pelo verde da natureza.

Acho que foi o primeiro sinal de que eu trabalharia com a natureza... qualquer aspecto dela. Lembro que a primeira coisa 'mais importante' relacionada à natureza que fiz foi cuidar de um jardim e de uma hortinha. Havia um espaço pequeno entre o muro da frente de nossa casa e a casa... era coberto de grama que no inverno agonizava com o frio intenso e no verão com o sol escaldante. Minha mãe tinha um trabalho danado pra mantê-lo verde.

O que eu fiz? Bem pertinho do muro, tirei a grama, cavei um pouquinho e adubei a terra durante um tempo com as cascas de batatas, cenouras, aipim e pedaços de tomates. Não é que as sementes de tomates jogadas na terra para adubá-la fizeram surgir plantinhas? Sim! Isso mesmo... a primeira coisa que plantei, sem ao menos saber que estava plantando, foram tomates. Os pezinhos cresceram e surgiram alguns tomatinhos.

Nem preciso dizer que me especializei em jogar sementes de tomate para vê-las se tornarem tomates novamente - isso na parte detrás da casa, em uma partezinha da horta de mamãe - que ela gentilmente cedeu para mim.

Próximo ao muro em frente à nossa casa, fiz um jardim. Como recebeu elogios o meu jardim! E daí em diante não parei mais de trabalhar na terra. Sou uma verdadeira especialista de trabalhos da terra, tornei-me material humano de primeira linha quando o assunto é terra... e outras coisinhas sobre animais, conhecimento que adquiri em um trilhão de cursos que fiz e em cinco trilhões de contato direto na casa dos agricultores de minha cidadezinha.

Mas é só isso!

Agora estou em outro universo... tenho de me adaptar.

E pensando, pensando cheguei à conclusão de que posso ser, ou babá, ou faxineira. Gosto de crianças e cuido muito bem de meu filho. E sei limpar uma casa como ninguém.

domingo, 5 de maio de 2013

O rapaz que me atendeu na Agropecuária Terraz foi muito simpático. Era um nativo, surfista... essa foi a primeira vez que vi um surfista ao vivo... só conhecia surfistas pela TV. Minha ideia de surfista é de alguém que não está nem aí pro mundo, pras pessoas do mundo.... também pensava umas coisinhas relacionadas a drogas (ledo engano).

Que ideia mais errada. Felipe era o nome dele (era não... é). Simpático, atencioso, ouviu minha história e, se fosse por ele, eu seria contratada. Mas não era ele quem decidia, quem decidia era o dono da loja. E não havia vagas... pra eu ser contratada, ele tinha de ser demitido. E não estava nos planos deles deixar de trabalhar.

O surf era de madrugada... durante o dia o trabalho (na Agropecuária)... à noite, os estudos.

Enfim, o que quero dizer é que não foi dessa vez que consegui emprego.

Mas... também, pra que me preocupar? Era o primeiro lugar, o primeiro trabalho que eu estava procurando.

Felipe pediu pra eu deixar o número de meu telefone, caso... ele decidisse sair do trabalho, ou se precisassem de mais uma pessoa... Ah! mas eu não tinha telefone. Então, falei que de vez em quando eu passaria para ver se não estavam precisando de alguém.

Voltei pro condomínio.... pensando, pensando. Tinha de ser rápida. Ficou claro pra mim que teria de encontrar outro tipo de trabalho. Não estava mais no interior onde a cada dois quarteirões há uma agropecuária, onde agricultores precisam de auxílio técnico...

Eu estava na cidade grande... no litoral... e de peixes eu não entendia nada... pelo menos de peixes de água salgada.

Eu ia conseguir encontrar uma solução... pra tudo há solução, não é?

O sol forte queimava....

quarta-feira, 17 de abril de 2013

No almoço, conversamos bastante, D. Marina e eu. Seu Augusto era um homem calado... pelo menos foi o que pareceu. Mas tinha um olhar tão bondoso, gestos tão calmos, que deixavam qualquer um à vontade. Almoçou devagarinho, mastigava a comida com uma tranquilidade que nunca vi igual. Tive a impressão de estar diante de alguém que jamais havia reclamado de nada. Alguém que sabia viver. Pensei: "aí uma pessoa que faz feliz quem está por perto".

Cadu estava felicíssimo... ele adora feijão, come feijão purinho, purinho... e o da vovó Marina - como ela disse a ele que a chamasse - estava realmente delicioso. Tomou suco e mais suco... e, de sobremesa, salada de frutas.

Depois foi pra frente da TV, assistiu a uns dois ou três desenhos e adormeceu. Seu João gentilmente se ofereceu para colocá-lo no quarto que havia sido de seu filho - agora era pros netinhos.

Ajudei D. Marina a recolher a mesa... a louça sempre ficava por conta do seu João.

Enquanto Cadu dormia aproveitei pra ir rapidinho a uma loja de produtos agropecuários (que depois descobri ser a única dos cinco ou seis bairros próximos à Trindade).

Minha experiência profissional em Terra Roxa: vendedora de produtos agropecuários. Claro que não era só isso que eu fazia lá.

Com a minha formação técnica, atendia a quatro, cinco... às vezes alguns mais... agricultores em suas casas.

Amo trabalhar na terra, entendo quase tudo de terra, plantação de hortaliças, flores e outras coisas mais que você joga uma sementinha e daqui a pouquinho vira algo pra comer.

Lá fui eu ver se conseguia um trabalho.

segunda-feira, 15 de abril de 2013

A vida dá um jeito...a vida sempre dá um jeito de nos surpreender... intercala surpresas boas e ruins. Acho que só assim dá gosto de viver. Se só houvesse surpresas boas, acho que iríamos enjoar... nem notar as coisas boas. Se só houvesse coisas ruins, não iríamos suportar, iríamos enlouquecer. Então, a vida mescla coisas boas e ruins... valorizamos aquelas, quando estas acontecem... suportamos estas, lembrando-nos daquelas.

Não sou o tipo de pessoa que fica buscando explicação pras coisas... sei que as coisas acontecem... o dia que deixarem de acontecer, estarei morta. Então, enquanto acontecem, estou viva... vivinha da silva. Também não sei se existe destino... prefiro não pensar muito nisso. Imagina se estou destinada a algo muito ruim... se estou destinada, não posso fazer nada pra mudar.

Acredito em Deus... mas é uma crença tão frágil. Na verdade, não sei bem se é tão frágil assim, porque morro de medo dEle. Se morro de medo de algo/de alguém, é porque acredito que esse algo/alguém existe... se não, não morreria de medo.

Errei tanto, pequei, segundo os padrões da minha religião, tanto... que só o que posso esperar é castigo... nesta vida e na outra (seja lá de que jeito for essa outra). Às vezes, me vejo no Purgatório... purgando, purgando, sendo acrisolada, limpada, purificada de todos os pecados... vejo a minha alma branquinha depois da limpeza... mas é engraçado que não me vejo no céu... depois da limpeza.

Mas, independentemente de pra onde eu vou... quero ensinar o meu filho a andar no caminho do bem... pro meu filhote não consigo ver nada que não o céu. E quero o céu pra ele agora também, não só depois... bem depois.

E estou desconfiada que um pedacinho do céu aqui na terra, no momento presente, é o apartamento da minha vizinha... e que ela é uma anja que Deus deixou vir pra cá pra me ajudar a fazer com que a vida de Cadu tenha um pouquinho do céu por aqui. Acho que Deus, acho, não, tenho certeza de que Deus sabia que eu não ia dar conta sozinha...

O almoço foi realmente maravilhoso.

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Quando estava girando a chave na fechadura da porta do apartamento, apareceu minha vizinha. Ela tinha um linda cesta na mão cheia de coisas. ´Um presente de boas-vindas´, disse ela... e me entregou a cesta.

Frutas, sucos, biscoitos, pãezinhos... e pro Cadu uma caixa de bombons.

Fiquei atônita... parada com a cesta na mão, sem saber o que dizer, como reagir. Não estou acostumada a esse tipo de coisas. De onde vim, presentes são dados a pessoas que conhecemos, de quem gostamos e em datas especiais. E aí, do nada, a minha vizinha que nem me conhecia bem estava me dando um senhor presente.

Ela percebeu meu embaraço e falou ´sempre faço isso... este é um apartamento pra alugar, e sempre estão chegando pessoas diferentes... gosto que se sintam bem aqui´.

´Claro, claro´, falei... ´é que fiquei surpresa... isso nunca aconteceu comigo... muito obrigada´, e dei um abraço meio sem jeito nela. Um abraço exatamente contrário do dela...

´Deixa que eu ajudo você a guardar as coisas´, falou, entrando comigo no apartamento. E eu continuava sem jeito, sem saber onde colocar nem as mãos... envergonhada. Agora, mais ainda, ela ia ver que eu estava em um apartamento quase vazio, frio, sem nadinha daquelas coisas que transformam uma casa em lar.

Ela pareceu não se importar com isso... mas uma coisa ela notou: não havia fogão na cozinha.... e como eu estava encabulada.

´Hoje vocês são meus convidados para almoçar... é bem simplizinho, mas todo mundo fala que o meu feijão é o melhor da cidade´, disse sorrindo, deixando aparecer duas covinhas em seu rosto redondinho.

Eu disse que sempre dou um jeito... agora, pensando melhor, a vida dá um jeito pra mim.


terça-feira, 9 de abril de 2013

Perdida em meus pensamentos fiquei por um tempo... só me dei conta de que o Sol tinha continuado sua caminhada pelo céu quando senti o seu forte calor em meu rosto. Já eram quase 11 horas. Quase hora do almoço.

Ah! o almoço... o que fazer, como fazer? Pensei em começar a reclamar da vida... por que eu? por que isso? pra que me colocar nesta situação?

Claro que imediatamente parei. Afinal eu tinha culpa no cartório... meu passado me condenava; então se a vida me impingia sofrimento era para me depurar, purificar... eu precisava disso. Tudo bem, mas e meu filho? O pequeninho não tem culpa de nada... o erro é meu... que seja eu a castigada.

Ainda pensando assim e num começo de revolta me levantei e segui na direção do meu pequeno.

Uma gostosa gargalhada me fez parar. Olhei na direção da gangorra e vi uma menininha com sua mãe. A mãe segurava na mãozinha dela e passava por todo o brinquedo, explicando o que era, de que material era feito, qual a cor. A mãe brincava: "adivinha de que cor que é?"... a menininha invariavelmente respondia "é azul" (nada na gangorra era azul).... e as duas caiam na gargalhada. A mãe pacientemente falava a cor correta.

A menininha não errava... ela simplesmente não enxergava.

Aquilo me tocou profundamente. Olhei pro meu filho e imaginei tudo o que essa garotinha não podia ver. O meu filho podia. O nosso maior problema era o almoço.

Sempre dizem que antes de reclamar a gente deve olhar pra quem está  pior. E sempre tem gente pior.

Peguei-o no colo, dei um milhão de beijos... e "vamos almoçar", falei.

Eu sabia que ia dar um jeito... eu sempre dou um jeito.

segunda-feira, 8 de abril de 2013

Não posso dizer que foi um sono tranquilo. A noite era quente, quase sufocante... nenhum ventinho. E os mosquitos fizeram a festa... percebi isso ao olhar pro rostinho de Cadu quando amanheceu.

A gente não pensa muito quando resolve se mudar de uma cidade pra outra. Não se dá conta de que tem de começar quase do zero... aos poucos fui percebendo como precisaria de dinheiro.

E, por falar em dinheiro, como ele facilita a vida. E como a vida pode ser dura sem ele. Se não me engano foi Wood Allen que disse, ou escreveu, não sei bem, que o dinheiro não traz felicidade, mas provoca uma sensação tão parecida que é necessário um especialista para verificar a diferença. Concordo com ele, neste momento de minha vida eu queria ter dinheiro, mais do pouquinho que tenho, pra, pelo menos, dar ao meu filho o básico: a sopa quentinha, o leite quentinho, o shampoo cheirosinho dele, o suquinho de laranja (o preferido dele), o suquinho do Bob Sponja (o segundo preferido dele), a banana amassadinha com mel e aveia.... e qualquer outra coisa que evitasse de ele ter seu rostinho picado pelos mosquitos.

Ah! mas eu vou conseguir... custe o que custar. Ele vai ter o básico e um pouquinho mais... ah vai... se vai! Os mosquitos estão com os dias contados....

O meu anjinho acordou um pouquinho antes das 9 horas. Todo sorridente, me abraçou e perguntou `vamos ao parquinho?`... `vamos sim, meu amor, claro que vamos`, respondi.

Tomamos nosso leite com cereal, escovamos os dentes e descemos ao parquinho.


Enquanto ele brincava com dois amiguinhos que fez logo que entrou no parquinho, eu pensava, pensava... fazia cálculos mentais... tentava organizar as ideias na cabeça pra depois colocá-las em prática na nossa vida real.

Eu preciso de um emprego... e é já. Eu preciso encontrar uma creche pro Cadu... e é já. Eu preciso... eu preciso... eu preciso... e aí fiquei, perdida em meus pensamentos.

segunda-feira, 1 de abril de 2013

Subimos pro apartamento. Na entrada do prédio, conheci Dona Marina (ela se transformou em minha ajudadora, espero que Deus dê a ela duas vezes mais do que ela deu pra mim... só com isso ela teria o suficiente pra viver dez vidas). Mais que uma mãe, mais que uma irmã, mais que uma amiga.

Ela sorriu, perguntou meu nome e o de Cadu. Falei algumas coisinhas sobre nossa chegada à cidade grande e ela falou: 'o que você precisar, conte comigo... moro no 22'.

Agradeci e pensei em anjos... acho que Deus espalha alguns por aí.

Banheiro... banho. Só aí lembrei que não tinha sabonete. Desci novamente e saí procurar um mercadinho. Há duas quadras do condomínio encontrei um. Comprei o sabonete, dois pãezinhos pro café da manhã (sem café, é claro), uma caixa de cereais coloridos, que o Cadu adorou e uma caixa de leite.

Banho tomado, comemos um prato de cereais com leite. Não foi bem um prato. Coloquei nos copos que estavam sobre o tampo da pia e engolimos. Não havia pratos, não havia talheres. Mas, tudo bem, eu sou craque em dar um jeito. E dei!

A noite estava quente, sufocante mesmo.. nem um ventinho. Deixei as janelas abertas pra ventilar e os mosquitos fizeram a festa...

Mais ou menos 9 horas, fomos dormir. Fiz um travesseiro com duas camisetas minhas, abracei meu filho e sonhei...

Um sonho cor de rosa... amanhã vamos sair e comprar cortinhas de florzinhas coloridas... uma manta colorida pra cama... travesseiros branquinhos, lençóis cheirozinhos, umas plantinhas pra alegrar o apartamento... e adormeci.

domingo, 31 de março de 2013

Na nossa chegada ao condomínio eu tinha visto um parquinho logo à direita, na entrada. Desci as escadas com meu filho e fomos diretos pra lá. Ele tirou as sandaliazinhas e correu pela areia, feliz, feliz... escorregou, balançou, rodou... escorregou de novo.... balançou... rodou...

Eu fiquei sentada no banco, perdida em meus pensamentos. Como é que alguém põe uma criaturinha tão fofa no mundo e um dia some? Não entendo. Ele parecia que seria um bom pai, parecia. Mas, entre parecer e ser há anos luz de distância. Eu olhava pro meu filho e pensava 'não vou deixá-lo sentir falta de um pai... serei pai e mãe, serei o que preciso for e farei o que preciso for  pra ele não sofrer, não sentir falta de nada'.

Depois de uns trinta minutos brincando, Cadu corrreu pro meu colo, me abraçou e disse: "Que lindo aqui mamãe... posso vir brincar sempre"? "Claro que pode.... aqui agora é nossa casa." Ele sorriu, pegou a garrafinha d´água, bebeu um gole enorme - ele é assim: bebe goles enormes; enquanto eu bebo de golinho em golinho -, pegou a maçã e correu pro balanço. E balançou, balançou, balançou... ou melhor, pediu pra eu balançar, balançar, balançar.

Estava anoitecendo. Nosso primeiro anoitecer na capital. O movimento de pessoas voltando pra casa aumentava. Crianças chegando da escola, papais e mamães chegando do trabalho, do passeio, da praia...

E eu olhava... todos pareciam ter uma vida de tanta paz. Uma vida de tudo certo. tudo no lugar certo. Uma vida de contas pagas, de geladeira cheia, de cama com lençóis perfumados, de mesa posta, de risos ao redor da mesa, em frente à TV. Uma vida de abraços reconfortantes, de sorrisos de estímulos, de incentivo.

E era Cadu e eu. Ele um garotinho... a geladeira vazia, o colchão sem lençóis perfumados, dinheiro apertado, sem TV, sem sorrisos.... não eu não ia deixar de sorrir. Acontecesse o que acontecesse.

Sorri pra Cadu e disse: "Hora do banho, garoto!!"

sexta-feira, 29 de março de 2013

"Estou com fome." A vozinha de meu filho me trouxe à realidade. Peguei sua mãozinha e voltei pra sala com ele. Hahah voltei!? Deis dois passos da cozinha pra sala. O apartamento era pequenininho. Cozinha com área de serviço junto. Na área de seriço, um tanque encardido, descascado, manchado.... mas eu ia dar um jeito nisso. Sou perita em dar um jeito em tudo... é em tudo mesmo, sim. Se não dou um jeito, dou outro.

Um pequeno corredor estreitinho... que imaginei ficaria lindo com fotos coloridas de Cadu nas paredes. À esquerda um quarto... à direita, bem em frente ao quarto, um banheiro (que você já conhece).

Peguei a sacola e as malas na sala e levei tudo pro quarto. Não era tão pequeno. Que bom! Cadu e eu ficaríamos bem instalados aí. Tinha uma cômoda, de aglomerdado, que parecia já ter andado de lá pra cá, pelo menos por quinze anos. Pobrezinha! Ela não tinha culpa da sua feiura. Mas eu ia dar um jeito de deixá-la bonitinha.

O problema seria, talvez, o fato de ter só uma cama (bem, mas isso eu resolveria depois). A cama de aglomerado, que nem é madeira,... é só um amontoado de pó de madeira e cola... parecia que ia se desmontar a qualquer instante. E pó de madeira estava por todo lado. "Cupim?!"... bela companhia, pensei com meus botões.

Sentei devagarinho esperando que a cama se estatelasse no chão. mas isso não aconteceu. O colchão não era dos melhores, mas, pelo menos, não cheirava mal. Não cheirava bem, mas não cheirava mal também. Nadinha que um pouquinho de sol e um ar fresquinho não resolvessem.

Deixei as malas ao lado da cômoda. Tirei da sacola duas maçãs, um pacote de bolachas Traquinas (as preferidas de Cadu) e a nossa garrafinha de água. Pronto! "E lá vamos nós, passear no parque e fazer um lanche bem gostoso", disse sorrindo para meu filhote.

Abri a janela do quarto... pra refrescar, pra ventilar, e saímos, felizes, nós dois.

Continua.....

quinta-feira, 28 de março de 2013

O apartamento era pequeno e frio. Frio no sentido de não ter o aconhego da minha casinha em Terra Roxa. Mas, tudo bem, isso é apenas um detalhe. 'Vou transformar este espaço em um lar pro meu filho, pelo meu filho', pensei.

Larguei as duas malas e a bolsa na sala. E fomos ao banheiro. Sempre que chegamos de algum lugar, ao entrar, vamos diretamente lavar as mãos. Que banheiro pequenininho... e cinza. O meu banheiro era todo branquinho. Adoro branco. Na minha casinha, quase tudo era branquinho. Havia um pouco de cor, bastante de cor quero dizer, mas a cor estava nos detalhes.

'Tudo bem. Um banheirinho cinza que logo, logo, vai ficar colorido com uns tapetinhos coloridos, toalhas coloridas, uma saboneteira colorida e talvez alguns peixinhos coloridos ao lado do espelho'... imaginei. Pronto! Estaria resolvido o problema do cinza e do chão todo descascado.... Há e completaria com uma cortina no chuveiro... uma cortina de peixinhos coloridos também, pra alegrar o meu garotinho.


Depois fomos para a cozinha. Cadu estava com sede. Carlos Eduardo, meu filho, a razão da minha vida agora. Não importava o que eu tivesse de passar, só queria uma vida feliz pro meu amorzinho. Na cozinha, confesso, fiquei um pouco desolada. A minha cozinha era tão branquinha e completinha. Tinha de tudo, muito simples, mas de tudo e tudo bem limpinho.

A do apartamento, bem, não era um primor. Uma bancada encardida de pia. Uma geladeira toda descascada, com partes completamente tomadas pela ferrugem, com a porta torta (eu tinha de fazer um esforço enorme pra encaixá-la) e só... ficamos três meses sem fogão. Hoje eu penso, como consegui passar esses noventa dias sem fazer a sopinha que Cadu adorava e tomava todas as noites antes de dormir lá em Terra Roxa? Mas, passou, sobrevivemos sem sopa. Aprendemos a comer outras coisas antes de dormir... coisas que não precisavam ser cozidas.

Havia dois copos de requeijão vazios sobre a bancada da pia. Abri a torneira, deixei escorrer água durante uns cinco minutos, até ela ficar mais clarinha. Lavei o copo, enchi e dei pro Cadu. Lembro que segurei com força as lágrimas para não escorrerem pelo rosto.

Não, o meu menininho não iria  me ver chorar. Afinal agora estávamos morando em uma ilha. E isso era simplesmente maravilhoso. Nossa vida ia ser maravilhosa.

Continua....

quarta-feira, 27 de março de 2013

Decidi definitivamente que sairia da minha cidadezinha em um dia muito frio. Havia geada branquinha cobrindo o gramado em frente de minha casa. Havia geada cobrindo todos os canteiros de minha horta atrás de casa. Aquilo me deixou triste. Aquela geada que queima tudo, queimou alguma coisa dentro de mim. Lembro que pensei 'nunca mais vou plantar nada'. Era dia 5 de junho.

Também tinha o jardim mais bonito da cidade. Sou técnica agrícola, uma apaixonada pela terra e por tudo o que nela cresce. Além do curso técnico, fiz, depois que saí de lá, faculdade de Agronomia...

Vou trocar as flores pelo asfalto. A casa por um apartamento. A cidade do interior pela capital.

A capital do Paraná é Curitiba. Uma linda cidade, mas fria, muito fria no inverno. E eu não sou fã do frio, gosto mesmo é do calor, do sol forte, da claridade.

Decidi por Florianópolis, pela bela Florianópolis. No dia 5 de setembro às 15:30 horas eu estava entrando no apartamento segurando na mão do meu filho.

Agora era nós dois e a vida...

Continua...
Este texto é dedicado a Robert W. .... quem quer que seja, onde quer que esteja.

Não quero mais ficar sozinha. Está decidido. E, quando decido, decido.

Meu nome é Ana Rosa. Nasci em 1967 e cresci em uma pequena cidade do interior do Paraná - Terra Roxa -, uma cidade que começou a se desenvolver com a plantação de café. Hoje ostenta orgulhosamente o título de Polo Nacional do Vestuário Infantil.

Vivi lá até 1990. Engravidei e casei. Casei porque engravidei. Tinha 16 anos... era uma menina. De família tradicionalmente católica, lembro que foi um escândalo... a gravidez, não o casamento. A separação três anos depois foi outro escândalo. Eu me tornei pária da família, a leviana... com potencialidades, mas que teima em fazer tudo errado.... pária não só da família, da sociedade também.

Terra Roxa se tornou pequena demais pra mim. Eu me sentia sufocar... e pensava no meu filho. Não queria a mesma vida pra ele. Seria sufocado junto comigo. Isso eu não podia deixar acontecer. Nós dois precisávamos de liberdade. Então, por que não mudar de cidade?

Mudar de cidade não é tão fácil. Mas eu decidi que mudaria e, quando decido, decido, nada me segura. Acho que sou a pessoa mais decidida do mundo.

Continua....