sexta-feira, 12 de julho de 2013

Minha prima, Je, é de uma beleza incrivelmente fantástica. E essa beleza confere a ela poderes que os não tão belos - como eu, por exemplo - não têm.

São perdoados os erros que ela comete, sempre. Lembro-me que desde criança ela tinha um tratamento privilegiado. Era ela e nós - os outros. Se Je queria brincar no parquinho da cidade, e o resto queria ficar brincando no quintal de casa... adivinha!? Íamos todos pro parquinho.

E, acredito que ter suas vontades sempre satisfeitas, tornaram-na no que é hoje: no mínimo, eu diria, difícil de se lidar.

Fiquei magoada com a carta? Não, claro que não... há muito tempo deixei de me magoar por não ser bem tratada por alguém. Acho que ninguém tem obrigação de gostar de mim... de me tratar bem. Aceito o sentimento genuíno das pessoas, e isso pra mim basta. E há os que gostam e os que não gostam de mim. Paciência....

Mas não posso dizer que não fiquei triste. Fiquei sim, tristíssima. Ser a causadora da tristeza de meu pai, mais uma vez... Pensar nele chorando me cortou o coração. A cena me perseguia por onde quer que eu fosse: o pomar lá da casa dele... as árvores balançando ao vento... os raios de sol passando por entre as folhas... o perfume das flores... o barulho do riacho que corre bem no fim do quintal. Tudo maravilhosamente lindo, acompanhando bem de perto a dor de meu pai.

De cortar o coração... mesmo. Mas a vida não é de toda justa. Ela comete erros. Ela atinge pessoas inocentes. Ela é a vida e ela faz o que quer.

Demorei uns diasinhos pra escrever uma carta aos meus pais... e responder a carta de minha prima.

Não queria nenhum tom de tristeza na minha escrita (e precisava ter o dinheiro pra comprar papel, envelope e selos - porque, enfim, tudo custa dinheiro).

sexta-feira, 5 de julho de 2013

A carta....

Prezada prima,

Como vai você? E o Carlos Eduardo? Conseguiu escolinha pra ele?

Aqui estamos todos indo bem, menos o tio. Desde que ele voltou de Floripa não é mais o mesmo tio alegre como eu sempre conheci. Gostaria que você me dissesse o que mais você fez de errado pra deixá-lo tão mal.

Pensei muito antes de escrever, conversei com a mãe, com o pai, com meus irmãos antes de tomar essa decisão. Todos me apoiaram. Todos disseram que eu deveria escrever pra você pra saber o que aconteceu.

Quando ele voltou, ficou três dias em casa, não saiu pra lugar nenhum; no domingo não foi nem pra missa. Todo mundo estranhou... você sabe, ele nunca falta.

No sábado tínhamos feito um churrasco pra comemorar o aniversário do pai... veio toda a família, mas ele não apareceu. A tia deu uma desculpa de que ele estava cansado da viagem.

No começo até acreditamos que ele estivesse cansado  mesmo... uma viagem de ônibus tão longa é muito cansativa mesmo. Mas o problema é que no meio da semana fomos lá na casa dos tios e vimos o quanto ele estava abatido.

A tia contou algumas coisa que ele disse... que ficou arrasado com a tua situação e do Cadu no apartamento, contou que vocês não têm muita comida, não tinham nem fogão e que ele comprou um pra vocês.

Mas disse que o que mais doeu foi ver que você no café da manhã só tinha dois pãezinhos e que deu um pra ele e pro Cadu... e que você ficou sem comer nada.

Eu sei que você fez tanta coisa errada, por isso tem de pagar por tudo. Deus realmente vai pesar a mão dele até você ficar completamente arrependida do que fez. Então, nós aqui de casa achamos que Deus está correto em deixar você passar por privações, por sofrimentos.

Mas o que não concordamos é que o tio tenha de ficar mal por você estar assim. Ele não tem culpa dos teus erros; ele sempre foi um homem muito bom, ajuda todo mundo. Ele não  tem que sofrer por você.

Quem errou foi você e quem tem de arcar com as consequências do erro é só você.

Não sabemos exatamente o que você tem de fazer. Mas, quando o tio for te visitar de novo - se ele for (porque nós achamos que a tia não vai mais deixar ele ir para aí) - pelo menos compre um pouco de comida e não reclame de nada. Diga que está tudo bem.

Procure um emprego que te dê condições de cuidar melhor do teu filho... ele não tem culpa de ter nascido em um lar que se desfez.

Também seria bom você escrever uma carta dizendo que vocês dois estão muito bem; nunca diga que está faltando alguma coisa. Mostre que vocês estão bem.... o tio tem de se convencer de que você está cuidando muito bem do neto dele, que não está deixando faltar nada pro Cadu.

Um abraço de todos nós da família,

Je

PS: a tia contou pra mãe que viu o tio chorando escondido. estou te contando isso pra você saber que é mesmo bem a greve a situação dele.